terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

O cigarro Galaxy e três discos excepcionais


Menos que uma dica, este texto na verdade se revela, num breve relato:

Eu não seria homem se não tivesse tido a sorte, oportunidade e prazer incontido, de ouvir três discos excepcionais.

Eu não seria completo.

E como um incompleto aglomerado de moléculas, tendendo a dispersão, vagaria na noite, bar em bar, usufruindo de minha ignorância e desfilando minha incompetência nas escolhas musicais que tivesse ousado um dia, preguiçosamente, fazer.

Como muitos e como poucos, seria apenas mais um produto da avalanche. 

Abriria meus ouvidos, minha mente e meu espírito, a todas essas montanhas de bobagens que gritam através de FM´s meretrizes, ou de discos muito abaixo da linha colifórmica.

Graças às forças do bem, isto de fato não aconteceu.  Fui salvo por três discos excepcionais, e pela feliz e inteligente convivência com Arlindo, o tio e Roberto, o irmão.

Criança do trabalho.  Completos 10 anos de idade.  O ano era 1978.  Plena copa da Argentina.  Anos de chumbo, e eu já era 80% Zico e 20% Flamengo.

Lembro, com uma clareza que assusta, do dia em que Arlindo chegou em casa com aquele disco.  O primeiro.  Era o inconcebível "Chico Buarque 78".  Aquele, que na capa, uma foto sorridente de Chico é emoldurada pela beleza muda de uma samambaia.

Seria mensagem criptografada ?  A samambaia que emudece enquanto generais despreparados exasperam ?  Nunca saberei.  Chico, às vezes, é muito hermético.  Quem duvidar leia "Estorno", livro que, garanto, só ele mesmo entendeu.

Mas o fato era outro.  Era o disco.  Uma obra-prima que ousou gritar músicas como "Cálice", "Trocando em Miúdos", e a imortal "Apesar de Você".

E o tio Arlindo ouvia e ouvia e ouvia de novo.  E eu escutava, escutava e acompanhava, curioso, a velocidade com que maços de cigarros "Galaxy King Size" eram solitariamente consumidos por Arlindo.


A fumaça espantava a tristeza e desligava a consciência.  Às vezes, ele precisava aceitar o que não podia mudar.  Como os anos de chumbo, por exemplo.


E num outro belo e pobre dia, 1981 ou, no máximo, 1982, observei de longe uma animada conversa entre Arlindo e Roberto, o irmão.  A bola rolava na copa da Espanha e Arlindo trazia de baixo do braço um disco excepcional.  O segundo.

Era o petardo "Simon and Garfunkel - Ao Vivo no Central Park".  Uma bomba maravilhosa que me apresentou o mundo do folk, do western e de Paul Simon.

É improvável que eu entenda por que os meninos e meninas de hoje não ouviram, ainda, canções como "The Sound of Silence", ou mesmo, "The Boxer", por exemplo.

Ainda há esperança.

Este disco foi 100% beneficente e marcou o reencontro da dupla, depois de anos de separação.  Peça básica e obrigatória na discoteca de qualquer mortal.

E o tempo passou mais um pouquinho.  Foi para frente até o ano que, acho, era 1985.  Encontrei Roberto no portão de casa, em animada conversa com Alexandre, seu grande amigo da lendária "Rua Ciência".

Sim, a conversa era musical.  Falavam, ou recordavam, de um disco muito belo, gravado em 1979 e lançado em 1980: "Supertramp, ao Vivo em Paris".  O terceiro.


Esse deu bastante trabalho.  Ninguém na rua, no clube ou no bairro possuía uma cópia.  Alexandre tinha uma péssima gravação em K-7, que infelizmente não tive acesso.

O disco era lindo.  Pérolas como "The Logical Song", "Breakfast in America" e "Dreamer" arrebataram meus ouvidos e escravizaram minha sensibilidade.

Resultado: sou fanático pelo "Supertramp" até hoje.

E foram, então, esses três discos que salvaram minha mente, elevaram meu espírito, e me imunizaram, para os resto da vida, contra todo o tipo de vírus, bactéria ou fungo que possa habitar hoje o comércio da não-música, contaminar agora todo o espaço artístico acessível e imbecilizar, para sempre, a mente e os ouvidos das novas gerações.

Ainda há tempo.

 GM


quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Quando conheci um tinto da Califórnia



Comecei a beber vinho, como hábito e prazer, nos idos de 1995.  Logo após meu casamento.  Bebia um tinto delicioso, não-varietal, rotulado como Blossom Hill.

Era um californiano simples, frutado e acessível.  Tudo aquilo que eu não sabia que procurava, mas procurava.

Não entendia nada de vinhos.  Uvas, cortes, safras e outras bobagens.  Ignorava solenemente estes percalços e me concentrava naquilo que estava dentro da taça.

Naquela época, ainda não bebia vinho tinto todos os dias.  Este saudável e moderado hábito só adquiri em 2003.  A partir desta época conheci os malbecs argentinos e os cabernet chilenos.  Flertei com os tannat brasileiros e me desbundei com o bordeaux francês.

Me liguei nos rótulos, nos cortes e nas safras.  E continuei, até hoje, sem saber nada sobre vinhos.

Graças à Deus !

Aprendi a dar valor ao conteúdo, aroma, paladar, cor e valor do vinho.  Deixei de lado as bobagens e o falso eno-conhecimento.

Comecei a me dedicar mais ao hábito, a música, aos amigos e ao momento do vinho.

E sou feliz, ignorante, assim mesmo.  Afinal, quem não é ?

GM


segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Pixinguinha, o bom e velho imortal, como Machado


Pixinguinha nos deixou, exatos 40 anos e 01 dia atrás.

Na já distante data de 17 de fevereiro de 1973, ele se foi para alegrar outras paragens com sua música genial.

Pixinguinha foi, e é, um músico erudito na forma e na expressão mais popular da palavra.  Seus arranjos eram, ao mesmo tempo, lindos e sofisticados.  Sua música era, e é, recoberta por uma aura de beleza e, ao mesmo tempo, de elaboração técnica.

Com o mesmo pijama listrado, sentava à mesa com chorões, bambas do samba, músicos eruditos, maestros e, também, com Louis Armstrong, um de seus mais devotos discípulos.

O velho Louis, um dos lobos do jazz, teria dito sobre "Carinhoso", obra eterna: "...como eu pude ter deixado de compor esta canção...".  Ou ainda: "...como um gênio do porte de Pixinguinha não pôde ter nascido em New Orleans...".

Esse monstro sagrado da música mundial, era perfeito na composição, no arranjo e na execução daquilo que escrevia.  Não dependia de músicos contratados ou de profissionais de aluguel, para expressar sua própria arte.

Não vou aqui citar nenhuma obra como referência.  Seria heresia !

Quem  quiser beber da música de Pixinguinha, que o faça por inteiro !  Carinhosamente, ou na base da jaca cortada, mesmo !

Hoje seria um dia festivo em qualquer país do mundo, reservado a homenagens, em qualquer lugar do planeta. 

Qualquer lugar decente homenagearia esta data e seu poeta-musical, ou ao menos a citaria.

Qualquer lugar menos aqui, no nosso Brasil-vergonha.

Só como exemplo, posso citar que Machado de Assis (um dos 20 maiores escritores do século XIX), morou em 12 ou 13 casas diferentes no Rio de Janeiro.  Tudo ali, entre a Gambôa e o Cosme Velho.

De todos esses endereços, todos conhecidos e divulgados, somente 01 foi preservado urbanisticamente e culturalmente.  Todos os demais estão abandonados, depredados e encortiçados.

Uma pena.  Uma vergonha.

Só de brincadeira, digitei hoje no Google a palavra "Pixinguinha" e, como resposta, obtive 104 verbetes sérios.  Fiz a mesma coisa com as palavras "Lady Gaga" e vieram mais de 600.000 massacrantes referências.

Não satisfeito, digitei a palavra "Joelma" seguida de "múisca" e o retorno foram mais de 12.000 sufocantes referências.

Isto é mesmo a cara do Brasil.

Um país sem cultura, que forma um cidadão sem escolhas.

Salve, Pixinguinha !

GM

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

E começa o carnaval em Brasília

De agora, até o próximo recesso do legislativo, já tem início o verdadeiro carnaval do Brasil.

O de Brasília !!

A festa ininterrupta será regada a fartas doses de recursos públicos, com lantejoulas de corrupção e paetês de incompetência na gestão.

Este célere carnaval terá, possivelmente, a duração de 10 meses e será o maior espetáculo da Terra !!!

Um festival que se repete a cada ano e que se renova a cada 04 anos !

Eleitor que vende voto é criminoso !  Eleitor que se deixa manipular é corrupto, também !

GM

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Luiz Gonzaga

Um gênio.

Um dos maiores músicos do século XX.

Uma lenda.

Uma referência acadêmica na arte da harmonização e na criatividade do movimento e da divisão.

Um monstro !!

Deveria fazer parte da grade curricular de todas as escolas de música do mundo.  Estudar Gonzaga é estudar a música em sua forma viva !

Ouvir Gonzaga é  um deleite.  Um prazer.  Uma honra.  Uma viagem.  Um suor danado.  E um orgulho troncho de grande !!!

Eita cabra bom !

GM

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Brasil, sem corrupção este país não anda !


Sou favorável a profissionalização da corrupção no Brasil.

Já que somos a eterna piada global, quando o assunto é a seriedade das instituições públicas, deveríamos instituir a corrupção, como meio vigente em nosso país.

Ela passaria a ser a ordem.  A bandeira.  O lema.

Teríamos escolas de corrupção.  Especializações, MBA's, fóruns de debate sobre o tema.  A corrupção seria integrada ao currículo escolar básico, fazendo parte da grade curricular que definiria o padrão sócio-comportamental do cidadão.

Desde crianças.  Tenra idade.

Teríamos hierarquia para a corrupção: analista de corrupção júnior, pleno e sênior.  Gerente regional de corrupção, gerente geral de corrupção, diretor de corrupção...

A corrupção seria segmentada: departamento de desvio de verbas, agência nacional de superfaturamentos, coordenação regional de compra de votos...seria tudo organizado, com metodologia e procedimentos operacionais registrados em manuais.

Teríamos o dia nacional da corrupção e o prêmio cidadão corrupto do ano !

Nossos filhos conversariam em suas rodinhas:

- ...Hoje meu pai desviou R$ 10 milhões...
- ...Só isso ?  Meu pai consegue isso no café da manhã !.

Os executivos e membros de autarquias teriam metas de corrupção.  Metas em moeda corrente, aonde seria necessário atingir determinado volume de dinheiro desviado, determinado número de votos comprados...tudo com indicadores, crescimento contra o ano anterior e com relatórios e KPI's de acompanhamento.

Tudo lindo !

Em casa, no desabafo com a esposa, um desses agentes da corrupção diria:

- ...Meu bem, estou preocupado, não estou atingindo minhas metas de compras superfaturadas, estou com medo de perder minha posição... .

E a esposa, amada, tranquilizaria e orientaria:

- ...calma querido, estamos com você ! Você só precisa mentir mais, roubar mais e desviar mais.  Eu sei que você consegue.

Na pátria da corrupção, os políticos fariam discursos para eleitores felizes, dizendo que em seus mandatos a corrupção subiria no mínimo 10 pontos percentuais e que novos segmentos de corrupção seriam explorados: a corrupção na educação, na medicina e na justiça, entre outros.

Aplausos e sorrisos banguelas e amarelos seriam enfileirados.

Este cenário, apesar de cômico hoje, não de todo ficcional.  Num passado muito recente, um vendedor tentava fechar um negócio com um jovem comprador de uma instituição federal e ao perceber que o recém formado comprador, jovem e inexperiente, não iria cobrar propina, interrompeu a negociação e ligou para seu chefe na fábrica:

- Chefe, o  cara aqui não está cobrando os 10% !

E o dito chefe, surpreso teria dito:

- Não está cobrando o "dele" ?  Então sai daí agora !  Não feche negócio !  Só pode ser armação !

Sim, amigos.  Sem corrupção nosso país para, trava, fecha.

Vão faltar insumos na indústria, alimentos nas prateleiras, combustível nas bombas e remédios nos hospitais.

Como um país viciado, nosso Brasil depende da corrupção para continuar vivendo.

Por essa e por outras, somos a piada do planeta e a vergonha dos corretos.

GM

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Sting, entre o rock e o jazz


 
Sting não é mais um pop star.

Acho que de fato, era isso que ele sempre quis.  Ser um músico qualquer.  Não anônimo, mas qualquer.  Se olharmos para a trajetória dele como músico, poderemos entender como foi improvável e difícil essa trajetória.

Deixar de ser pop e passar a ser mais um.

No começo, havia o The Police.  E uma proposta de se fazer um rock and roll diferente.  Um pé na Jamaica e outro em Londres.  Um braço no ska e outros no rock.  Na atmosfera pós-sex pistols de 1979 havia muito espaço para criação.  Diferente da revolução psicodélica de 1968 e do Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band, o mundo pré-anos 80 era meio instrumental e meio tecnologia.

Uma tecnologia ainda remota, mas que já proporcionava algumas experiências para Talking Heads e Lou Reed.   E para David Bowie e Peter Gabriel, também.

Nesta época Sting era a voz e o contra-baixo do Police.  Não era nem a sombra do músico que é hoje.  Do músico que se tornou.

Escolhi falar de Sting hoje, pelo que escutamos ontem. 

Fritamos quilo e meio de filé de tilápia e nos aninhamos na mesa dos fundos.  Escolhi dois discos para ouvir.  Um era o “Trem Azul” da Elis.  Gravado ao vivo, com alguma qualidade técnica e uma exuberância vocal digna de uma das maiores cantoras do mundo.

Elis era uma estrela.

O outro era o “Nothing Like The Sun”, de 1987 que tem a música “Fragile” gravada em português e inglês, graças à Deus.

Um disco lindo que flutua entre um pop de muito bom gosto e um jazz arredondado e acessível.  Perfeito !

Clássicos como “We’ll be Together” e “They Dance Alone”, altamente politizado, foram imortalizados pela beleza do arranjo e escolha perfeita das harmonias.

Um trabalho de gênio !

O disco é o segundo da carreira solo do Sting e teve a participação de Andy Summers e Mark Knopfler.  Dois monstros da guitarra.

Valeu a noite.  Valeu o peixe.  Valeu ouvir de novo esse belíssimo trabalho de jazz-rock, que recomendo aqui aos amigos.
GM