Chegando em casa, sozinho, me livrei da roupa com cheiro de rua e fui direto pro chuveiro. Abri o quente no máximo e deixei a água lavar a alma. Literalmente. 30 minutos de puro zen.
Com cara de monge lavada no sabonete me enrolei na minha Hering favorita e larguei o roupão por cima.
Abri um tinto chileno justo e revolvi a estante de LP´s.
Aproveitando a solidão passageira (em poucos 32 minutos a turminha do barulho estaria de volta) pus na agulha do velho Gradiente minha última rara aquisição: Live at Fillmore East, do Allman Brothers.
A agulha yk-200 deslizava suave, como que passando a ponta da língua atrás da orelha dos sulcos do disco.
Uma maravilha !
Tomando o 1º gole do veludo vermelho que estava na garrafa, pensei: "Putz...viver é simples...".
Greg Allman, num modesto volume 18 da potencia, sussurrava: "I can´t live without a song".
Me estiquei preguiçosamente no canto preferido, do meu sofá predileto, na compania de meus ácaros de sempre.
Degustei mais um gole. A taça de cristal brilhava num tom vermelho, quase Gilda.
Cerrei os olhos um poquinho enquanto o som da mais fantástica banda de south rock me embalava.
Quase nos braços de Morpheus, ouvi a porta da frente bater num repente e a voz conhecida de meu filho berrar:
- "PaiÊÊÊÊ !!! Chegamos !
Respirei fundo, abruptamente reconduzido ao mundo real, e pensei: com o era doce o meu deserto !
O moleque se jogou no meu colo de uma distância de 2 metros, derrubando vinho, taça e tudo o mais.
Sabe o que eu fiz? Enchi aquelas bochechinhas rosadas de beijokas espetadas pela minha barba mal feita.
Esse é de fato um momento impagável !
GM
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