quinta-feira, 13 de junho de 2013
1984, de George Orwell, em 2013
Quando assisti a uma reportagem na TV sobre o livro "1984", de George Orwell, confesso que não tinha a maturidade necessária para entender.
Naquela época, meados dos anos 1980, Orwell (seu livro e o consequente filme) eram um completo mistério à minha geração pop. Nossa turma bebia de águas muito mais rasas e se permitia, no máximo, a ler as linhas divertidas que Orwell verteu na "Revolução dos Bichos".
"1984" era, de longe, um assunto pouco interessante.
Mas o tempo é senhor de todos os caminhos e, como sempre o faz, seguiu em frente. Muitos anos depois ganhei de presente de aniversário um belo exemplar de "1984". O livro teve que ser paciente comigo. Aguardou na estante durante todo o tempo que durou minha fase de biografias e de livros de música pop.
Aguardou e soube esperar sua vez.
Quando de fato comecei a leitura, pude lembrar da reportagem de anos antes, cujo repórter abria, lendo o trecho inicial do livro: "...Era um dia claro e frio de abril e os relógios marcavam uma da tarde...". E depois começava sua crítica, dizendo: "...Assim começa um dos mais tristes e tenebrosos livros escritos nos últimos anos...".
Não estou seguro se a fala do repórter era essa mesma. Também não me lembro seu nome, um global ainda hoje em atividade. Mas receio que ele tenha acertado em cheio na mensagem.
"1984" é um livro único. Pode gerar, naquele que o lê, vários tipos de reação. Medo, revolta, incredulidade, nojo, asco, raiva, tristeza e sentimento de impotência. Essas reações são produzidas não pelo conteúdo, inócuo, do livro, mas sim pela certeza de que suas linhas não são mera ficção.
Principalmente, quando comparamos o livro à nossa realidade. O estado controla tudo. O estado vê tudo. O estado é tudo.
A escravidão intelectual (e ideológica) se torna mais sentida e agressiva do que a escravidão física do cidadão. O Grande Irmão (Big Brother) tudo vê, tudo sabe e tudo quer.
No livro, o passado é reescrito várias vezes, para melhor manipular a massa, que sabe disso e o aceita com passividade. Cada indivíduo deixa de sê-lo, à medida que, por força do medo, se deixa engrenar numa estrutura tão grande e perene, que não pode sequer ser questionada.
O presente é o exercício da agonia ideológica e o futuro, um mero detalhe.
O livro é triste, sim, mas é um aviso também. Olhe ao redor e veja se o estado tem a dimensão que deveria e se os meios de comunicação estão sendo usados para, de fato, comunicar, ao invés de manipular.
O conceito de Big Brother foi imbecilmente colado a um programa de TV que ajuda justamente a mimetizar este processo. Levando conteúdo imbecil, parra mentes imbecis que se deixam imbecilizar ainda mais.
Isso sim, é triste.
Hoje, 2013, a intimidade de muitas pessoas já é vasculhada, investigada e detalhada em nome de um bem maior (a segurança), através da tecnologia que serve, ao mesmo tempo, de analgesia e de conteúdo.
Resta entender que bem maior é este e a quem ele beneficia. Resta entender qual será o próximo passo, na devassa da individualidade e na construção de uma grande massa disforme, manipulável e moldável, na fôrma do interesse de alguém.
Nada é gratuito.
Toda essa neuro-estrutura que está aí, com trilhões de conexões e trilhões de bilhões de possibilidades, faz parte de uma arquitetura maior, com objetivos maiores.
Talvez a matriz já exista.
Talvez já saibamos disso. Tudo ficará como como está e com a nossa aprovação servil, afinal, pensar e racionalizar são atos cada vez mais distantes e cada vez mais ausentes.
GM
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