Uma conversa descontraída de
sábado à tarde.
O já tradicional churrasco estava
quase no fim. Estava finalizando a picanha
ou dourando a costelinha. Não importa.
A conversa caminhou para a
música, como na maioria das vezes que reunimos os amigos no nosso cantinho da
bagunça. Falávamos do que estávamos
ouvindo e naquele momento ouvíamos Beatles.
Meio que metido à besta, falei
que nossa coleção de discos beatlenianos estava completa. Tínhamos finalmente toda a discografia
oficial e a última aquisição fora o raro “Love Songs”, de capa marrom, lançado
apenas em vinil na década de 1970.
Num estalo e com a razão que a
pureza dá às crianças, meu filho interviu dizendo que nossa coleção dos Beatles
estava longe de estar completa. Faltava,
por exemplo, o disco “Strawberry Fields Forever”.
Disco ? Zombei do alto de minha imodéstia
falante.
Argumentei que “Strawberry Fields
Forever” era uma faixa de um grande disco, mas que não se tratava de um disco
autoral e nem coletânea, a não ser pelo compacto de mesmo nome lançado no final
da década de 1960.
Insisti na minha posição, mesmo
sob os protestos gerais de que o tal disco de fato existia e que fora visto uma
vez num site de discos raros.
Seria balela ?
Numa das paredes da área de lazer
afixei um quadro, tempos atrás, com as miniaturas de todas as capas de todos os
discos dos Beatles. De “Please, Please
Me” até a coletânea “Love”, produzida por George Martin.
Usei esse quadro como argumento
final dizendo que se “Strawberry Fields Forever” fosse um disco, a capa estaria
ali no quadro. Ponto final.
Sepultei a questão, apesar dos
firmes argumentos de meu filho.
Passa o tempo. Poucos dias, na verdade. Estava em viagem a trabalho, na rotina de
sempre: aeroporto-cliente-almoço-cliente-jantar-hotel-aeroporto. Na volta pra casa observei que havia, junto
ao lobby do hotel, uma espécie de feirinha de velharias incríveis. Uma senhora, acompanhada de uma jovem de uns
20 anos, vendia por ali de tudo um pouco.
Observei isqueiros antigos, facas
e lanternas. No canto do balcão uma
pilha de discos de vinil descansava em paz.
Um deles me golpeou o rim
esquerdo ! Era uma capa de long play,
dos Beatles, de nome “Strawberry Fields Forever” !!!
Como ???
Peguei a capa
apressadamente. Li seu conteúdo
externo. Tratava-se de uma coletânea,
lançada pelo fan clube dos Beatles e que não teve fins comerciais. Não foi vendida em lojas e teve uma tiragem
bem reduzida.
Raro de verdade !
Faixas inéditas. Gravações à capella e uma raríssima versão de
“O Barbeiro de Sevilha” nas vozes harmonizadas de John e Paul.
Um pequeno detalhe: a capa estava
vazia. Faltava o LP.
Perguntei a senhora sobre o disco
e ela me disse que os tirava das capas e os deixava empilhados num caixote,
pois as pessoas só compravam as capas para usar como decoração. Os discos ninguém comprava.
É óbvio que quase morri do
coração na hora. Seria fulminante se o
tal caixote não estivesse ali, bem ao lado.
Procurei com cuidado e encontrei
o vinil, com poucas avarias e uns poucos arranhões. Comprei e com carinho transportei para casa.
O final de estória é previsível:
meu filho, cheio de razão, zombando de minha arrogância de dias antes. Muitas gargalhadas em comum e o disco
espetado na agulha, tirando aquele som que só eles sabiam fazer.
Vou ter que mandar fazer outro
quadro.
GM
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