sexta-feira, 26 de junho de 2009

MoonWalk

Michael Jackson representou para mim, o mesmo que representaria para qualquer pessoa que tivesse vivido a inacreditável explosão de sentimentos que foram os anos 80.
A década perdida.
Não perdemos nada. Achamos. Achamos o POP, o nascimento do hard rock, a profissionalização do metal, o advento dos grandes shows, a especialização da mídia, a familiaridade com o caos econômico, social e cívico. O Rock in Rio I. A seleção de 82. Os primeiros beijos. As primeiras carícias. Os primeiros seios nas mãos. Os bailes. As danças. Os amigos. A música.
E Michael.
Parece uma sina esquisita que ainda não foi bem explicada. Muitos gênios carregam a dor junto com a luz. Carregam a faca junto com a cura. Muitos sofrem para criar. E da dor, criam. E da cria, choram. Ele era um pouco assim, um pouco demais assim.
Eu e Michael, em quatro cenas:
1. 1980: comprei uma camisa meia-manga da marca Levi´s. Era uma camisa xadrez, em tons cinza claro. Comprei só pela promoção: um disquinho compacto de acetato que rodava em 33 e 1/3 e trazia duas faixas de Janis Joplin: The Woman Left Lonely e Me and Bob McGee. Comprei também, por que o filme da mídia me chamou muito a atenção: um acampamento de jovens...uma modelo lindíssima...um cara bonitão (que se não me engano era o Paulo César Grande)...e ao fundo, a velha Janis castigava: The Woman Left Lonely...uma voz linda e rouca.
Rapidamente em casa pus o compacto no velho Sonata do meu irmão e ouvi. Horas depois chamei uma menina da rua (Eliane, acho) em quem estava de olho, para ouvir comigo. Ela concordou e perguntou se podia levar o disquinho dela também. Lógico que concordei, pois queria mesmo era ver aquelas coxas apertadas numa mini-saia. Por curiosidade perguntei:
- De quem é o disco ?
- Do Michael Jackson ! Conhece ?
Eram Music and Me de um lado e do outro lado, ABC. Congelei ao ouvir.
2. 1982: Na casa de meu amigo-irmão Robélio, escutamos uma música que mexia, nervosamente, com nossa energia: era Don't Stop 'Till Get Enough. Um pedrada. Uma porrada. Colocar esse som alto e ficar sentado era impossível. Uma energia quente subia pela barriga e arrepiava os pelos dos braços. Agente sentia vontade de gritar, de dançar e de cantar até perder o fôlego. Naquela época dançávamos em grupinhos e seguindo os mesmos passinhos (era idiota, mas eram os 80...!); namorava uma menina da rua chamada Cláudia (acho...!) certa vez ouvimos juntos este som e depois da música, me abraçando apertado, perguntou:
- Nossa o que você tem ?
Ternamente calei sua boca com um beijo novo e respondi nervoso:
- Não sei, estou me sentindo estranho.
Era a música desse cara. Que operava uma certa transformação na minha forma de perceber o mundo.
3. 1984: A rede manchete passaria no domingo a tarde um especial sobre Michael Jackson. Seria apresentado por um jovem ator chamado Marco Nanini, que despontava como talento naquela época.
Naquele dia por volta das 18h00m, na rua onde morava, ninguém, absolutamente ninguém, estava fora de casa; todos estavam de TV ligada e olhar atento e devoto. Era impressionante. Somente observara algo assim 02 anos antes, no fatídico Brasil e Itália da copa da Espanha.
Nada nas ruas. Todos de olho na telinha. Lembro-me de que o combinado era a turma toda assistir o show na casa do Ney, que tinha uma varanda grande com TV.
Preferi assistir sozinho em minha casa.
Sentei no chão na frente da TV e não pisquei nenhum um segundo durante todo o programa. Acho que ele tinha 25 anos e eu 15 ou 16 anos. Naquele dia assisti pela primeira vez uma coisa assustadoramente linda. Um troço de tirar o fôlego: esse cara, fazendo um show no teatro Apollo de NY, foi dançando até o canto do palco e voltou andando para trás...ou para frente...parecia truque...mas era Michael Jackson...era o passo de dança que mais tarde ficou conhecido como MoonWalk. Fiquei eletrizado.
4. 1987: Caetano e Chico faziam um antológico show na TV Globo. Show que virou série, e que por sua vez, era uma tentativa de reproduzir o lendário show dos anos 70, Chico e Caetano, gravado ao vivo no teatro Castro Alves.
Caetano começou a cantarolar um tema muito parecido com Billie Jean:
" 'Tava jogando sinuca, uma nega maluca me apareceu. Trazia um menino no colo e dizia pro povo que o filho era meu."
Não sei se era uma cançoneta folclórica ou de Clementina, mas se assemelhava ao refrão de Billie Jean, e muito.
Na sequência o bom baiano emendou um Bilie Jean com arranjo para violão, voz e pandeiro...gênio...Caetano Jackson.
Depois cresci. As espinhas se foram. Meu interesse por música foi substituído por mulheres, festas e bebidas. Voltei a ouvir a raíz da MPB, me servindo do acervo do Arlindo e o Michael, esse cara que morreu ontem , ficou mais distante do meu gosto musical.
Voltou forte ao meu encontro depois de lançar Bad, para depois sumir novamente.
Ontem ele morreu. Uma morte besta. Uma morte morta.
Por que os gênios precisam somatizar tanto e ir embora tão cedo ? Por que se foram tão apressados Elis, Elvis, Noel, Sinhô, Hendrix, Joplin e Jim ?
O que é que tem lá do outro lado, para essa gente ter tanta pressa assim ?
Fiquei muito triste com a morte de Michael. É como se uma ficha enorme caísse sobre minha cabeça. Os anos passam, mesmo.
Aqui em casa tenho Off the Wall (indispensável), Thriller (inenarrável) e duas coletâneas bestas. Como dica, guardem estes dois originais, pois são de longe, as obras mais autorais desse cara.
Aos pouquinhos a tristeza está passando. Um tinto amigo me acalanta, um cafuné safado da esposa me anima e o nó na garganta vai descendo, assim...assim.
Meu rosto no espelho tem as mesmas marcas. Vou seguir em frente meu caminho. Hoje com um sentimento misto de ressaca e saudade. Amanhã...melhor que hoje.

Afinal, who's bad ?

GM

2 comentários:

  1. Gil eu me lembro de tudo,que saudades né?

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  2. É estranho pensar que a vida é tão tênue e que a dama morte pode nos acenar a qualquer instante..., talvez isso seja natural...mas, é estranho.
    Creio que não se trata de temer ou não este momento,
    Mas, de uma sensação do que “ficou sem ser feito”...
    No caso de Michael Jackson...sentirei falta do cantor/compisitor e performer mas...como pai e como homem um grande MERDA!
    JP

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